Deutsche Welle
Catharina Wagner estréia seu "Mestres-Cantores de Nurembergue" no Festival de Bayreuth sob olhares atentos. A bisneta do compositor é favorita para a direção do festival, fundado em 1876. A Deutsche Welle a entrevistou.
Desde 1999, quando Wolfgang Wagner, diretor do Festival de Bayreuth e neto de Richard Wagner, anunciou que estava em busca de um sucessor para o cargo, amantes do festival e especialistas da música clássica não param de especular: quem será o afortunado herdeiro?
Aos 29 anos, Katharina, filha caçula do diretor de 88 anos, desponta como favorita para o cargo, deixando para trás a irmã mais velha, Eva Wagner-Pasquier, e a prima Nike, ambas de 62 anos. Na noite de abertura da 96ª edição do festival, nesta quarta-feira (25/07), ela apresenta sua versão da ópera wagneriana Os Mestres cantores de Nurembergue, que seu pai já encenou três vezes em Bayreuth.
DW: A imprensa tende a escrever sobre os Wagner como uma espécie de família real. Isso a incomoda? Como você lida com esse tratamento?
Katharina Wagner: Você nasce com um nome, não o escolhe. É claro que, se eu tivesse me tornado uma advogada, eu não teria que lidar com isso. Mas adoro minha carreira de encenadora, e procuro separar minha vida privada do meu trabalho. Espero não ser vista sempre como uma Wagner, mas sim como uma artista independente.
Quando dou uma entrevista ou falo sobre o meu trabalho, faço isso não como Katharina Wagner, bisneta de Richard Wagner, mas como diretora de Os Mestres Cantores de Nurembergue. Não sou mais interessante por ser parente de um grande compositor. Essa foi uma realização dele, não minha, e eu prefiro falar sobre as minhas.
Você tem contato com os membros da sua família que também são figuras bem conhecidas no meio musical?
Sim. Mas eu fico fora de todas as disputas familiares. Não me envolvo com todo esse estresse público, eu me mantenho distante.
Ao contrário de outros diretores, ir para Bayreuth, para você, significa voltar para casa. Isso é uma vantagem?
Conheço muito bem a casa, as pessoas, os costumes, o que certamente é uma vantagem. Mas a pressão sobre os diretores é muito grande em Bayreuth, e isso vale tanto para mim quanto para todos os meus colegas.
Você cresceu e estudou em Bayreuth e, depois de sair de lá como filha do chefe, está voltando como chefe. Como é voltar como diretora?
Eu lido com isso com muita naturalidade. As pessoas sabem do que sou capaz e do que não sou, então não acho que haverá qualquer problema de autoridade. Fui assistente durante anos e todos me conhecem. E não tenho nenhum problema com isso, mas não posso falar pelos outros.
Você foi assistente de seu pai e de outros diretores. O que você aprendeu de seu pai que considera indispensável à sua carreira atualmente?
O know-how técnico. Apesar de meu pai e eu seguirmos linhas estéticas muito diferentes, há uma técnica básica que todo encenador precisa ter, e isso eu aprendi muito com meu pai. Por exemplo, como as pessoas se posicionam no palco, fazendo parecer que estão olhando um para o outro enquanto ao mesmo tempo podem estar olhando para os monitores – coisas práticas que são essenciais para poder dirigir.
Outros artistas e diretores marcaram o seu trabalho?
Claro. Em cada espetáculo que se vê, se aprende um pouco, como fazer ou como não fazer. Além disso, há pessoas que me trazem muita inspiração, como [Hans] Neuenfels, [Sebastian] Baumgarten... Recentemente vi um trabalho maravilhoso de David Hermann na Basiléia, e também de [Sebastian] Nübling em Stuttgart.
Então não precisa ser sempre Wagner?
Não, não precisa ser sempre Wagner.
Mas você tem trabalhado quase que exclusivamente com Wagner desde que começou.
Se eu fosse diretor-geral eu faria exatamente isso, porque essa combinação Wagner-Wagner funciona muito bem. Eu entendo por que eles propõem isso. E também gosto de encenar Wagner.
Por que Os Mestres cantores de Nurembergue?
Quando uma peça me é oferecida, me pergunto se me diz algo, ou não. Nesse caso, me disse. Se, há três anos, meu pai tivesse me oferecido Tristão e Isolda em vez de Os Mestres cantores, eu teria dito "ainda não" – agora eu daria conta, mas há três anos eu ainda não teria encarado.
Você pode dar alguns exemplos de como as suas concepções estéticas diferem das do seu pai?
Em relação a figurino, meu pai prefere estilos históricos ou atemporais. Ele sempre tem elementos históricos, até mesmo nas produções que sem uma localização precisa no tempo. Eu prefiro um estilo mais moderno, até por causa do movimento que as roupas proporcionam. Este é um exemplo concreto.
Onde você situou os seus mestres cantores?
Não é num local muito concreto. Não é na Idade Média. Também não é importante o fato de a história se dar em Nurembergue. Para mim, Nurembergue corresponde a uma locação espiritual.
Minha produção se dá numa sala com muitas portas, que também é extremamente fechada e a princípio parece muito pesada, mas com a entrada dos mestres cantores começa a brilhar mais. Por fim, vêm novos impulsos de fora, e o sistema de Nurembergue já não pode mais existir como existia, e então Nurembergue muda, no fim do segundo ato.
A inovação colide com a tradição, e a forma como uma se relaciona com a outra é, para mim, a questão mais fascinante nessa ópera: qual é a relação entre inovação e tradição, e entre a arte – ou o artista – e a sociedade?
Em relação à possibilidade de você se tornar a próxima diretora do festival, seu pai já disse: "Se ela pode, então deve". Como você vê essa afirmação?
Isso é muito típico do meu pai. Qualquer um que o conheça saberá que este é o autêntico Wolfgang Wagner. Embora, na verdade, ele tenha dito "se ela pode e quer". Há uma diferença.
Mas se ele falou, é porque acha que você está pronta. Que condições seriam necessárias para aceitar a posição?
Não depende só de mim. Depende predominantemente de outras pessoas. No momento, o meu pai acumula as funções de produtor e diretor do festival, mas essa constelação vai mudar. Haverá quatro diretores gerentes, cada um, naturalmente, com expectativas altas em relação ao diretor do festival, às quais não sei se poderei atender. É também uma questão que precisa ser discutida – o que os produtores esperam, o que eu espero deles. Essas coisas têm que se encaixar.
Qual é a condição mais importante para você?
Que a qualidade artística permaneça.
Você poderia citar duas coisas que manteria a qualquer custo e outras duas que mudaria imediatamente?
As condições de ensaio teriam que ser mantidas. Para os diretores é sensacional poder ensaiar no palco original, para os cantores também é muito agradável. Outra coisa que precisa ser mantida é a atmosfera familiar do festival. As pessoas valorizam esse clima de grande família, e é por isso também que gostam muito de vir. Quanto às mudanças, há muitas coisas básicas, como, por exemplo, o site do festival.
O que você mais desejaria para si, neste momento?
Sinceramente eu gostaria muito de me deitar na praia, ficar de frente para o mar [risos]. Não, brincadeiras à parte: que a estréia seja um ensaio muito bom. E que não esteja quente demais no teatro, pois no ano passado os cantores sofreram, sem ar-condicionado.
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