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Violência contra manifestantes não ocorre por despreparo da polícia brasileira – ela é um reflexo de uma sociedade que aceita o uso de meios violentos na repressão policial, opinam sociólogos.
Especialistas ouvidos pela DW Brasil afirmam que o uso da violência por parte da polícia brasileira – como na repressão aos recentes protestos em São Paulo – não se deve à falta de treinamento, mas à maneira como a manutenção da ordem e o uso da violência são percebidos pela sociedade brasileira.
Ao acompanhar manifestações, a polícia possuiu duas funções: respeitar o direito dos manifestantes de protestar e, ao mesmo tempo, impedir que atos ilícitos e de destruição do patrimônio sejam cometidos. A concentração de um grande número de pessoas pode dificultar essas tarefas.
"O controle de multidão tem que ser feito com muito jeito. No caso brasileiro, temos uma polícia militar que é muito violenta e truculenta, e é claro que esse padrão também aparece na repressão a manifestações. Foi exatamente o que vimos em São Paulo", afirma o sociólogo Pedro Rodolfo Bodê de Moraes, da Universidade Federal do Paraná.
Para os especialistas, a polícia recebe o treinamento adequado, mas age de maneira violenta por questões relacionadas aos valores da sociedade brasileira, que aceita o uso da violência na repressão policial, e também por esquecer sua função de proteger o cidadão.
"Se a polícia não entende o seu lugar e papel na sociedade democrática de Direito, não há treinamento que resolva", diz a socióloga Haydée Glória Cruz Caruso, da Universidade de Brasília (UnB).
O conceito de ordem
Segundo a Constituição, a polícia militar no Brasil tem as funções de preservar a ordem pública e fazer policiamento ostensivo, ou seja, coibir o crime por meio de sua presença e, nesse contexto, reprimir as violações no momento em que acontecem.
O entendimento do conceito de ordem na sociedade brasileira é um dos fatores que levam às repressões violentas de manifestações e ao preconceito contra os manifestantes, dizem os especialistas. "No Brasil, a noção de ordem é não se manifestar e não exigir direitos. O contrário é visto quase sempre como baderna, ou seja, é como se manifestações políticas e sociais fossem um crime", diz Moraes.
Para Caruso, que é pesquisadora do Núcleo de Estudos sobre Violência e Segurança da UnB, a maneira como a sociedade brasileira percebe a ideia de conflito – como a ausência de harmonia – também contribui para a violência policial.
"É como se a polícia vivesse um dilema institucional, no sentido que ela entende que precisa se modernizar e estar mais próxima dos cidadãos. Mas quando está diante de uma situação particular, não consegue implementar isso. A questão é muito mais estrutural, pois a sociedade reproduz uma série de discursos impregnados de preconceitos", diz Caruso.
Estrutura arcaica
Apesar das mudanças que a polícia vêm realizando em termos de formação e também na tentativa de aproximação com a população, resquícios de estruturas autoritárias anteriores até mesmo à ditadura militar ainda estão presentes nessa corporação, avalia Moraes, que faz parte da Comissão da Verdade do Paraná.
"A polícia brasileira sempre serviu muito mais para a manutenção de privilégios e para a repressão pura e simples dos mais pobres, em vez de garantir a ordem pública, fundada num conceito de respeito ao cidadão e de proteção aos mais fracos. Na prática, ela continua atuando como se fosse uma polícia de repressão aos movimentos e aos pobres, como se fosse a polícia da ditadura", argumenta.
Moraes aponta como solução para a redução da violência a mobilização da sociedade para exigir mudanças, além da desmilitarização e reestruturação da polícia no Brasil. "Após a ditadura, não houve mudanças estrutural alguma na instituição, que continuou sendo o que sempre foi durante esse período. É necessário investir em desmilitarização e fortemente na unificação das polícias civil e militar", afirma.
- Data 17.06.2013
- Autoria Clarissa Neher
- Edição Alexandre Schossler
- Link permanente http://dw.de/p/18rML
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